MIGUEL ESTEVES CARDOSO (*) - VENHA O ALEGRE
Venha o Alegre
Um monárquico é sempre suspeito mas é insuspeito quando se trata de eleger um Presidente da República. Apesar de nunca ter votado em eleições dessas, quis que Mário Soares ganhasse. E ele foi esplêndido. Como um rei.
Metia-se na política mais do que um rei. Mas foi bom. Hoje, é melhor ainda. Mário Soares é o mais perfeito diabinho que já tivemos. Está sempre a fazer merda, mas a merda acaba sempre por ser a solução de uma ainda pior prisão de ventre.
O PÚBLICO de anteontem contava como Manuel Alegre conta com o apoio do PS e da esquerda. Não obstante a distinção implícita entre o PS e a esquerda, sem maiúscula, Alegre quer ser eleito por todos os portugueses que não são de direita. Incluindo bastantes que são da esquerda séria e da direita tonta. Como bipolar de ambas as coisas, digo já que vou votar em Alegre. O apelido é bom, como a campanha de Eça e Ramalho. O homem é homem e poeta. Seria perfeito se fosse homossexual. Mas a parte que lhe falta para tal coisa é igualmente aceitável.
As minhas duas filhas votaram nele. Isto convence muito. Todos os monárquicos e fadistas que conheço gostam dos versos e das letras dele. O homem é irresistível.
Alegre é a prova viva que os dois mais sábios e inteligentes portugueses que conheço – o neurologista Alexandre Castro Caldas e o historiador Vasco Pulido Valente – só não escreveram letras lindas para a Amália porque a Amália e o Alain Oulman não fizeram o trabalho de casa.
Melhor do que isso não há.
Miguel Esteves Cardoso – 17-04-2010
(Fonte : Público)
(*) Membro do Conselho Monárquico da Causa Real, Miguel Esteves Cardoso nasceu em 25 de Julho de 1955, e é um crítico, escritor e destacado jornalista português.
Nascido no seio de uma família da classe média-alta lisboeta. O pai português, Joaquim Carlos Esteves Cardoso, oficial da marinha, e a mãe inglesa, Hazel Diana Smith, deram-lhe uma infância feliz e uma educação privilegiada que lhe proporcionou uma cultura invulgar em relação à maioria dos jovens da sua geração. O facto de ser bilingue desde o berço deu-lhe uma visão distanciada de Portugal e dos Portugueses. Foi um aluno brilhante e sobredotado, com um talento invulgar para a escrita.
Em 1979, na Universidade de Manchester, licencia-se em Estudos Políticos, prosseguindo na mesma universidade para o doutoramento em Filosofia Política, obtido em 1983 com uma tese sobre A Saudade, o Sebastianismo e o Integralismo Lusitano. Aí tomou contacto estreito com as bandas pós-punk e New Wave da editora Factory, tal como Joy Division, New Order, Durutti Column (de Vini Reilly; o álbum "Amigos em Portugal" contém o tema "Sara e Tristana", dedicado às duas filhas gémeas de Esteves Cardoso, nascidas em 1981) ou The Fall. Em 1982, no regresso a Portugal, entra para o Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa como investigador auxiliar na área de cultura política. Foi ainda professor auxiliar de sociologia política no ISCTE, um dos fundadores do Gabinete de Filosofia do Conhecimento, "Visiting Fellow" de St Antony's College em Oxford e fez um pós-doutoramento em filosofia política sob a orientação de Derek Parfit (All Souls) e de Joseph Raz (Balliol).
A sua carreira académica só será interrompida em 1988, quando é lançado O Independente.
As brilhantes crónicas do "MEC" (como era conhecido pelos fãs) sobre música pop publicadas nos jornais "Se7e", "O Jornal" ou "Música & Som" eram avidamente lidas pelos jovens portugueses, em complemento à transmissão dessa música em programas como "Rock em Stock", de Luís Filipe Barros, ou "Rotação", "Rolls Rock" e "Som da Frente" de António Sérgio, na Rádio Renascença e na Rádio Comercial. Nos anos 80, funda, com Pedro Ayres Magalhães, Ricardo Camacho e Francisco Sande e Castro, a Fundação Atlântica, a primeira editora portuguesa independente, produzindo discos de nomes como Sétima Legião, Xutos e Pontapés, Delfins, Paulo Pedro Gonçalves, Anamar e o supra-citado "Amigos em Portugal" dos Durutti Column. Daria também contributo directo à música pop portuguesa como letrista -- "Alhur" de Né Ladeiras e Foram Cardos Foram Prosas (com música de Ricardo Camacho, interpretada por Manuela Moura Guedes) Foi autor e co-autor de diversos programas de rádio como "Trópico de Dança", "Aqui Rádio Silêncio", "W", "Dançatlântico" e "A Escola do Paraíso", todos transmitidos pela Rádio Comercial.
Nessa época, escreveu também sobre livros e cinema no "JL - Jornal de Letras, Artes e Ideias". Começou igualmente a ser presença muito solicitada na rádio e na televisão, em parte devido à sua aparência invulgar e desajeitada de jovem betinho intelectual tímido-ingénuo-perverso e às suas intervenções imprevisíveis e desconcertantes, cheias de ironia e de irreverência. Estabeleceu polémicas com alguns intelectuais e escritores do sistema estabelecido como Fernando Namora ou Eduardo Prado Coelho.
A convite de Vicente Jorge Silva, tornou-se colaborador do Expresso, o mais lido e prestigiado semanário português, onde as suas lúcidas crónicas de teor satírico, "A Causa das Coisas" e "Os Meus Problemas", obtiveram imenso sucesso e aplauso do público.
Monárquico e antieuropeísta convicto, em 1987 candidatou-se a deputado independente pelo PPM ao Parlamento Europeu, mas não foi eleito, apesar da sua popularidade entre a juventude da classe média. Simultaneamente, incentivado pela actriz Graça Lobo a integrar-se na Companhia de Teatro de Lisboa, dedicou-se à dramaturgia ("Carne Cor-de-Rosa Encarnada", encenada por Carlos Quevedo e "Os Homens", encenado por Graça Lobo). Traduziu também várias peças de Samuel Beckett, montadas pela mesma companhia. Colaborou ainda com Herman José no programa "Humor de Perdição".
Em 1988, juntamente com Paulo Portas fundou o semanário O Independente, uma lufada de ar fresco que revolucionou o jornalismo português. Foi um contraponto conservador e elitista (mas simultaneamente libertário e culto) à imprensa esquerdista que prevalecia na época. Teve como colaboradores gente como Vasco Pulido Valente, António Barreto, João Bénard da Costa, Maria Filomena Mónica, Agustina Bessa Luís, João Miguel Fernandes Jorge, Joaquim Manuel Magalhães, M.S, Lourenço, Maria Afonso Sancho, Leonardo Ferraz de Carvalho, Pedro Ayres Magalhães, Rui Vieira Nery e Edgar Pêra. Atribuiu uma enorme importância à fotografia, contando com o trabalho de fotógrafos importantes como Inês Gonçalves, Daniel Blaufuks e Augusto Alves da Silva. Enquanto Portas e Helena Sanches Osório faziam estremecer os alicerces do governo cavaquista, com a denúncia semanal e impiedosa de escândalos políticos, Esteves Cardoso no destacável "Vida" ocupava-se da parte cultural, onde continuava a escrever crónicas e textos de superior qualidade. Fazendo dupla com Paulo Portas entrevistou algumas das figuras mais marcantes da política e cultura portuguesa.
Uma dessas figuras foi o Prof. Agostinho da Silva na série de programas televisivos "Conversas Vadias" em que o filósofo português era confrontado com as perguntas de diversas individualidades. MEC foi um desses entrevistadores, e aquele que mais desrespeitou e afrontou o grande pensador e vulto maior da cultura lusófona.
Em 1991, conforme combinado antes da fundação do jornal, deixa a direcção d' "O Independente" a Paulo Portas para criar a revista mensal K, financiada pela Valentim de Carvalho, pela SOCI, a empresa proprietária de "O Independente" e, mais tarde, por Carlos Barbosa. Apesar da excelente qualidade gráfica e colaborativa, durou apenas dois anos, vitima da sua irresponsabilidade comercial. No entanto, a dedicação à literatura vai-se intensificando, até que acaba por afastá-lo do jornalismo activo. O seu primeiro romance (O Amor É Fodido) foi um "best-seller", em parte devido ao título escandaloso.
Em 1995, com o final do cavaquismo e a saída de Paulo Portas, que trocou a direcção do jornal pela política activa no CDS, O Independente iniciou o seu lento declínio, não obstante o regresso de Esteves Cardoso à direcção em 2000, de onde saírá no ano seguinte, quando o semanário é comprado e dirigido por Inês Serra Lopes. Apesar de grandes esforços, a jornalista também não consegue impedir a morte de "O Independente" em Setembro de 2006. Ao longo dos anos 90, MEC colaborou em vários talk-shows, o mais famoso dos quais foi A Noite da Má-Lingua, na SIC, onde semanalmente, sob a moderação de Júlia Pinheiro e na companhia de Manuel Serrão, Rui Zink, Rita Blanco, Alberto Pimenta, Luís Coimbra, Constança Cunha e Sá e Graça Lobo, eram satirizadas figuras e situações da vida pública portuguesa e internacional.
No final dos anos 90, misteriosamente e por motivos que nunca revelou, abandonou por completo os ecrãs televisivos, tornando-se mediaticamente invisível. Publicou mais dois romances, A Vida Inteira e O Cemitério de Raparigas e continuou a escrever crónicas em jornais, primeiro no O Independente, mais tarde no Diário de Notícias e hoje em dia no Público.
Em 1999, criou um blog chamado "Pastilhas" que abandona em 2002. A partir de Janeiro de 2006 retoma a sua colaboração no Expresso.
Bibliografia
- Escrítica Pop (1982)
- A Causa das Coisas (1986)
- Os Meus Problemas (1988)
- As Minhas Aventuras na República Portuguesa (1990)
- Último Volume (1991)
- O Amor é Fodido (1994)
- A Vida Inteira (1995)
- Cemitério de Raparigas (1996)
- Explicações de Português (2001)
- Lorelei
- O Musical
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