quarta-feira, 13 de julho de 2011

A FALÁCIA DO SALAZARO-MONARQUISMO

Vê-se por vezes certos monárquicos, por saudosismo do império, percepção de que Salazar era “um de nós”, moralidade pessoal do homem, nojo do PREC que se seguiu, ou do facto de o seu sucessor, Marcelo Caetano, ser, esse sim, claramente republicano e terem a ideia de que tivesse Salazar sobrevivido a transição para a democracia e a monarquia seria à Espanhola. Todas estas considerações são ou extremamente erradas ou pura e simplesmente imorais de um democrata e indignos de um monárquico a sério. Quero dedicar este texto a desmontar esta deturpação do monarquismo Português verdadeiro. Vamos por partes.

Comecemos pelo saudosimo do império. O Império é sempre, mais ou menos, mas sempre, sustentado com base em opressão, em evitar a independência de povos, mais ou menos, mas sempre, oprimidos. O Império Português assim era. A opressão dos nativos africanos assim era. Ouve uma reação ridícula pelos PRECistas aos retornados (acusando-os de opressores dos Africanos como se não fosse o governo e não o cidadão comum branco das colónias o opressor. Se bem que a abordagem revisionista demonstra uma outra imagem do racismo das colónias que desconhecíamos)? Houve. Seria desnecessário a saída daqueles Portugueses que nunca tinham visto Portugal nalguns casos, todos para fora de África? Seria. Mas isso foi tudo culpa do acumular do problema por um Salazar que recusou-se a descolonizar, criando um sentimento de estar farto da situação tão grande que excepto os ex-colonos e um ou outro saudosista ninguém quis ou quer saber grande coisa, e se me permitem ser egoístas, a ideia de que o MFA vendeu esses países para os comunistas e a ruína, primeiro não é bem assim (excepto Guiné-Bissau, todos os outros têm economias aceitáveis) e mesmo que seja deixem-me ser egoísta: o problema é dos Africanos, é deles para resolverem eles. Além de que, numa sociedade que não podia estar menos interessada no passado colonial (no simbolismo dos Descobrimentos, é outra história…), tentar redimir um ditador baseado nisso ante um movimento monárquico que quer rejuvenescer não interessa nem ao menino Jesus.

Quanto a Salazar ser dos nossos, Salazar começou como monárquico e opôs-se quando era estudante à Primeira República, e teve certos flirts com o Integralismo Lusitano monárquico, mas tão cedo quanto 1919 alinhou com o Centro Católico Português. O que era o CCP? Era um partido Social-cristão/Democrata-cristão que defendia que contra os excessos anti-clericais da I República, a comunidade católica para se defender deveria unir-se num partido que entre quanto à questão do regime (Monarquia ou República) ficasse ao centro, não se identificando com nenhuma delas porque entendiam os seus líderes não ser útil a questão do regime, que só atrapalharia e atrasaria a sua luta. Vou trocar por miúdo: antes sequer do 28 de Maio Salazar alinhava com políticos católicos que tinham desistido da questão do regime, para eles tanto lhes fazia. Vou deixar isso entrar: TANTO LHES FAZIA. Como se mais prova fosse precisa vendo como Salazar só usou os monárquicos, convencendo-os a aderir ao regime e à União Nacional, usando a restauração como uma cenoura para fazer andar o burro, mas nunca concretizando, levando a cisões da Causa Real que era vista como cedendo mais ao regime, criando os Monárquicos oposicionistas, semente do PPM.

Quanto à moralidade pessoal do “Botas”, isso não compensa nem a corrupção ao seu redor, nem o nível de subdesenvolvimento a que o seu modelo nos votou, nem os indicadores sociais terceiro-mundistas, etc. etc. etc. Ser agarrado ao dinheiro e não gastar os dinheiros públicos não é demais se pensarmos que (à Luís XIV), o Estado era ele, logo não podia esbanjar dinheiro do Estado, o Estado era ela (aliás a coisa mais “monárquica” sobre Salazar era esta pose de Primeiro-Ministro de um Rei do Absolutismo, e mesmo isso não é modelo para um monárquico democrata do século XXI, nem de um do século XIX seria).

Quanto ao PREC, foi mau, péssimo, mas durou cerca de um ano. E depois veio o desenvolvimento do país. Foi feito muito disparate, os políticos ficaram mais corruptos? Sim mas pelo menos com democracia podemos imaginar e trabalhar por um país melhor. O Estado Novo tinha finanças que invejamos mas um povo maioritariamente na miséria. Hoje pelo menos podemos dizer nunca mais a uma mortalidade infantil de Terceiro Mundo. Obrigado Soares, governo PS-CDS, AD, Bloco Central e I governo Cavaco (e porque não mesmo Marcelismo e ala reformista do tardo-salazarismo dos anos ’60).

Quanto ao Caetano ser mais republicano, é verdade. Mas Salazar não era nada. Há quem disparate que o Salazarismo era “a monarquia possível”. Mas a realidade é que era a “república impossível”, a república com Primeiro-Ministro que era algo entre Castelo Melhor e Pombal (o Conde e o Marquês desses títulos, não as terras obviamente). Achar hoje que Salazar queria a restauração é alucinação, sonhar hoje com esse talvez que nunca aconteceria é lunático. E achar ”bem, mas não sendo nada poderia ceder, ao contrário do mauzinho do Caetano”, é ainda mais ridículo (Salazar, que não cedeu ante movimentos crescentes pela democracia e o fim da guerra, ia ceder ante um movimento monárquico oposicionista que era só parte da oposição total, ou ante os monárquicos do regime, poucos e menos influentes que os republicanos deste?).

Salazar é o culpado do nosso subdesenvolvimento, de não termos transitado bem para a democracia, e Deus sabe quanto mais. Marcelo é pouco melhor, mas chegava a ser mais papista que o papa, continuava a achar-se um coitadinho no exílio apesar de não ter tido coragem de fazer a reforma completa que poderia ter-lhe salvado o couro (não foram só os ultras, mas o seu próprio medo de os alienar que o impediu). Estamos conversados?

Vítor André Ferreira Monteiro

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