REFLEXÃO SOBRE POLÍTICA AGRÍCOLA
Começa a generalizar-se em Portugal a preocupação sobre o estado actual do nosso sector primário.
A questão agrária ganhou adeptos, pelo reconhecimento social da sua debilidade actual.
É francamente positiva esta tomada de consciência social, apesar de tardia.
A questão pode ser abordada em dois níveis, ambos de natureza política.
1- Através dos direitos dos povos que constituem Nações, terem o direito inequívoco a uma reserva estratégica alimentar, que no caso português está a um nível que coloca totalmente em causa a soberania nacional e um direito básico e essencial da sua população.
2- Através da perspectiva correcta do aproveitamento dos recursos naturais, do equilíbrio social e ambiental harmonioso de todo o território e ainda na vertente económica e financeira de produzir para o mercado e diminuir a dependência e os custos em produtos importados.
Se podemos aspirar a um alargado consenso teórico sobre as premissas anteriores, já será bem mais difícil encontrar consensos quanto às soluções a adoptar.
Portugal perdeu a sua autonomia em termos de política agrícola e tem apenas a débil faculdade de influenciar as políticas sectoriais agrícolas da União Europeia.
Existe até uma tentativa de colocar no debate da agenda política a questão, se deveremos ou não, ter num Governo um Ministro da Agricultura.
Efectivamente, de acordo com os Tratados a nossa margem de manobra para mudar a situação da Agricultura e das Pescas, é ao nível dos princípios políticos e muito menos de natureza sectorial.
De acordo com o 1º nível de análise enunciado (a questão da soberania nacional) é evidente que se trata de uma questão de natureza política da própria União Europeia … ou estamos perante uma Federação ou estamos perante Nações, que não podem (não devem) abdicar dos seus próprios interesses e muito menos ficarem sujeitos a situações de inferioridade, marginalização e penalização, seja de natureza alimentar, seja económica, social ou ambiental. Se estamos disponíveis para o caminho Federal, então teremos de aceitar esta marginalização no aproveitamento dos nossos recursos, o elevado custo da nossa estagnação agrária, a exploração dos nossos recursos marinhos e os riscos evidentes de carências de abastecimento alimentar.
A opção é assim de política externa portuguesa, nada tem a ver com facto de ter ou não ter ministro, mas sim de querermos continuar a ser Nação ou simples Região ou Estado.
Defendi sempre, que cada Nação da União Europeia, deveria ter o direito à definição rigorosa, dentro de um princípio definido na dupla consideração sobre dois conceitos fundamentais…o direito a uma reserva estratégica alimentar de produção própria ( com políticas autónomas de fomento) e o direito à sua harmonia territorial paisagística e ecológica que nunca será possível sem uma politica agrícola diferenciada e adaptada às particulares situações de Portugal.
A abordagem de acordo com o 2º nível de análise política para o sector primário, implica uma clarificação de qual é a nossa actual e real autonomia política para tomar decisões de apoio ao desenvolvimento do sector primário.
Qual o nosso espaço de manobra político?
A actual Politica Agrícola Europeia, a que estamos vinculados, impede-nos de medidas próprias de fomento agro-pecuário. Já seria excelente, mesmo sem a abordagem da questão da soberania alimentar, mesmo que não tivéssemos capacidade para alterar a injusta actual Politica Agrícola Comum, agir de forma a viabilizar o que nos resta de Agricultura e Pescas e com isso tentar manter uma parte da população activa no sector primário.
Para tal, também não será determinante a existência ou não de Ministro da Agricultura…seria determinante o reconhecimento de que salvo as excepções (parte do sector vinícola, horto-frutícula e parte do sector Florestal), os outros subsectores não têm condições de viabilidade financeira empresarial e mesmo familiar, pelas limitações naturais da nossa estrutura agrícola e climática … mas sobretudo porque a essas limitações se adicionam os custos elevadíssimos de produção, que decorrem dos preços dos combustíveis e energia, que impõem preços incomportáveis de muitos outros factores de produção ( rações; adubos; serviços; pesticidas; etc) aos sub-sectores, que impossibilita totalmente a concorrência num mercado globalizado.
Esta margem de manobra é assim, também ela exclusivamente politica … se queremos ter Agricultura e Pescas nos níveis mínimos aceitáveis … haverá que fazer uma politica específica de preços da energia e dos combustíveis, não apenas para o sector mas também para toda a indústria que lhe está a montante e transformadora… o Estado português, como está impedido de interferir nos preços, se quer preservar o mínimo de produção alimentar, terá de fazer uma decisiva opção política de isenção fiscal para o sector ou melhor de não penalização fiscal para o sector.
A esta politica de contenção dos preços dos factores de produção, terá ainda de ser assegurada uma politica de credito adequada e de cobertura de riscos…que o Estado português nunca quis encarar a serio, o que nomeadamente levou a que os investidores estrangeiros tivessem em Portugal muito melhores condições de sucesso, em particular os espanhóis, mas não só, que compraram muitas terras em Portugal e usaram muitos fundos estruturais destinados aos portugueses.
É evidente que não estamos a falar de desenvolvimento da Agricultura, que imporia o reconhecimento de Bruxelas da especificidade da nossa agricultura e mudanças nos fortes bloqueios e cotas de produção que nos são impostas …. estamos apenas a referir, em preservar o mínimo do razoável, numa perspectiva nacional.
É fundamental ter a noção que a actividade agrícola, pode ser estimulante como forma de vida, mas implica fortes sacrifícios que quem nela não é formado, dificilmente aceita na sociedade moderna… ocupação permanente e diária, sem direito a Ferias e Fins de Semana, no campo faça chuva ou sol, sem horários, pois o animal não escolhe o dia para parir ou adoecer e precisa de comer todos os dias do ano, pois o ataque do fungo, bactéria ou insecto, não espera pela hora conveniente ao agricultor, porque exige uma dedicação e um espírito muito especial em que o risco é uma constante e a compensação é muito aleatória.
A arte de empobrecer alegremente…como se dizia sobre a agricultura, de onde quem sai já não volta mais, nem seus filhos e netos.
A actual situação da Agricultura e também das Pescas portuguesas, é muito delicada e exigiria a devida atenção política e social.
Implica com gravíssimos problemas, que sem uma urgente e diferente abordagem da questão agrícola e piscatória, apenas se agravarão…problemas sociais e de ocupação do território, problemas ecológicos e ambientais, problemas económicos e de segurança alimentar da população.
Mesmo sem termos o direito a ter um Ministro da Agricultura (que Bruxelas dispensa) e uma Politica Agrícola (que Bruxelas impede), há que salvar o património nacional, humano, social e territorial …pela preservação dos que ainda restam como agricultores.
Salvaremos assim uma parte importante de Portugal, até em valores e tradições.
José J. Lima Monteiro Andrade
Fonte: Desafio de Mudança
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