domingo, 25 de julho de 2010

ENTREVISTA COM O MARQUÊS DE FRONTEIRA EM 1996

— Senhor Marquês de Fronteira, diga-me por favor o seu nome completo, e de quem é filho.

— O meu nome completo é Fernando José Fernandes Costa Mascarenhas. O meu pai chamava-se Fernando Penalva Mascarenhas e a minha mãe chama-se Maria Margarida Canavarro Menezes Fernandes Costa. Sou o representante das Casas de Fronteira, Alorna, Torre e Távora entre várias outras.

— Onde nasceu, e quando?

— Nasci em Lisboa, numa casa de saúde que havia na Avenida da República, no dia 17 de Abril de 1945.

— Quem foi o primeiro marquês de Fronteira, e como é que se notabilizou?

- O primeiro marquês de Fronteira foi Dom João de Mascarenhas, o edificador desta casa. Recebeu o título em 1670, dado por Dom Pedro II, ainda regente. O pai era o conde da Torre, que foi um título dado por Filipe III, e o filho acumulou os dois títulos.

— Sente alguma relação especial com ele, ou com outros dos seus antepassados?

- Diz-me muito o facto de ele ter construído esta casa, que eu conheço muito bem, não só ao nível óbvio, porque qualquer pessoa conhece bem a sua casa, mas a um nível mais profundo, porque ela tem sido para mim um tema de estudo e de investigação de alguns anos a esta parte. É uma casa que me fascina, e pela qual eu sinto uma afinidade especial, como sinto pelo primeiro marquês de Fronteira, que a edificou. Uma antepassada minha, de outro ramo da família, por quem eu também sinto uma simpatia e um interesse especial é a marquesa de Alorna, minha quinta avó, que foi uma mulher com um temperamento certamente muito difícil, o meu trisavô nas suas memórias queixa-se um boca-dinho das suas relações com a avó, mas ao mesmo tempo foi também uma mulher interessantíssima. Patrocinou vários salões literários como toda a gente sabe, inclusivamente aqui no palácio. Foi exilada por «sugestão» do Pina Manique, enfim, foram as chamadas «desintendências com o Intendente», que tiveram a ver com a criação da «Sociedade da Rosa». Não há assim muitas mulheres que tenham sido exiladas «por direito próprio», e até lhe posso contar um episódio engraçado: ela estava exilada em Londres, quando correu por lá o boato de que o rei, que era já Dom João VI, a perdoaria, e a autorizaria a regressar a Portugal, e ela antes de ter a confirmação dessa notícia meteu-se num navio, veio para Lisboa, e foi recambiada no dia seguinte no mesmo navio, porque de facto era só um boato, mas está a ver, era uma pessoa muito impulsiva, e eu acho-lhe muita graça.

— O Senhor Marquês ficou famoso pela vida boêmia que levou na sua juventude. E verdade?

— Não, esse foi o meu pai. Ele e o meu tio Antônio é que na sua juventude freqüentaram muito a noite lisboeta.

— E que estudos é que fez, Senhor Marquês de Fronteira?

— Sou licenciado em Filosofia pela Faculdade de Letras de Lisboa, e depois dei aulas na Universidade de Évora durante oito anos.

— Senhor Marquês, quais são os seus interesses culturais?

— Olhe, evoluíram um pouco com o decorrer dos anos. Comecei por me interessar pela pintura e depois pela música; a arquitectura é uma coisa que ainda hoje me interessa muitíssimo, e a poesia, desde muito novo e ao longo da vida me tem vindo a interessar e a fascinar.

— Algum poeta em especial?

— Bom, eu acho que Portugal é um país de poetas, não me parece que exista nenhuma outra área em que tenhamos um patrimônio tão rico, embora haja muito boa arquitectura, alguma boa pintura, alguma boa música, mas nada que se compare com a poesia. Há nomes que são de facto um pouco incontornáveis: Camões, Fernando Pessoa, mas também gosto do Mário de Sá Carneiro, do Manuel Bandeira, descobri há pouco tempo um poeta brasileiro, o Ivan Junqueira, que é também um poeta extraordinário da língua portuguesa. Fui um grande leitor de ficção científica, e ainda hoje gosto. Não sou um grande apreciador do romance português, nem sequer do Eça, para dizer a verdade, embora lhe reconheça o mérito. O Eça deixou–nos descrições magníficas da sociedade lisboeta, mas eu não sou de facto um apaixonado dos seus romances. No que diz respeito aos nossos romancistas contemporâneos, creio que ultimamente se tornaram de tal forma intelectuais que francamente, a maioria das vezes não tenho paciência para os ler. Prefiro a poesia, que é uma forma de expressão extremamente contida e onde o jogo das palavras faz todo o sentido para mim. Eu entendo que um romance tem de ter uma trama, uma história, e tem de ser empolgante. Caso contrário leio vinte ou trinta páginas e ponho de lado. Não leio romances por obrigação, e portanto não leio romances chatos.

— Senhor Marquês, quer explicar um bocadinho o que é a Fundação das Casas de Fronteira e Alorna? Eu sei que foi o senhor que a criou, sei que doou uma grande parte da sua fortuna…

— Sim, doei a grande maioria dos meus bens à Fundação, fiquei com muito pouco, embora continue a ter fama de ser uma pessoa rica, e ainda apareça às vezes na revista Fortuna como o detentor de uma das maiores fortunas de Portugal, que é uma coisa que eu devo dizer que me irrita um bocado, porque eu nem sequer era assim tão rico, mesmo antes de ter doado os meus bens à Fundação, pelo menos comparado com outras pessoas. Não quer dizer que fosse pobre, herdei uma fortuna sólida, esta casa e o Condado da Torre, de que aliás cheguei a ser expropriado; nessa altura fiquei só com esta casa que não é propriamente uma fonte de rendimento mas uma fonte de despesas. Mas enfim, recuperou-se o Condado da Torre, que é hoje uma sociedade, e eu doei 80 por cento das acções à Fundação. Portanto a minha mãe tem algumas acções, e eu fiquei com cerca de 12 por cento, enfim, dá para viver mas não dá para grandes extravagâncias. Fiz esta doação porque entendi que era a melhor maneira de preservar a Casa, entendi que tinha beneficiado de circunstâncias invulgares, porque o sétimo Marquês de Fronteira, que nasceu em 1802 e cujo pai morreu quando ele tinha cinco anos, por volta de 1807, ainda beneficiou da Lei do Morgadio. Depois teve uma filha única que não teve filhos, e que deixou os seus bens a uma prima, prima essa que foi marquesa de Fronteira, e pelo casamento marquesa de Ávila e de Bolama, a qual me deixou esta Casa e o Condado da Torre directa-mente a mim, embora eu não tivesse ainda nascido. Ela deixou ao filho mais velho do filho mais velho do meu avô. O meu pai já era vivo mas eu ainda não, isto foi, salvo erro em 1927, e eu nasci em 1945. Claro que havia outros bens, que foram divididos e distribuídos por outros membros da família, como é natural, portanto este palácio e o Condado da Torre foram-me deixados por uma tia-bisavó. Resolvi criar a Fundação, que me pareceu a melhor forma de manter a unidade e a ligação entre estes dois pólos e a família, e ao mesmo tempo fazê-la de urna forma não egoísta, torná-la uma coisa útil social e culturalmente. Temos dois ou três tipos de actividades. Temos colóquios, ou encontros, que têm um caracter, digamos, mais científico, concentrados normalmente em dois, três, ou até mais dias, durante os quais são apresentadas várias comunicações. Temos também ciclos com temas variados, este ano por exemplo tivemos um ciclo sobre a leitura do romance, estes ciclos são feitos em várias sessões, já tivemos sessões de poesia, já tivemos sessões de «contar histórias», tivemos outro dedicado ao memorialismo, a minha mulher deu aulas de pintura aqui no palácio para os alunos da ULTI, fizemos também ciclos sobre azulejaria, sobre História de Arte e História da Literatura e sobre temas ligados à família. Os colóquios antigamente eram gratuitos. Agora as pessoas pagam uma pequena taxa de incrição, e eu acho que é melhor assim, porque as pessoas quando pagam levam as coisas mais a sério. Os ciclos são de entrada livre, e costumam vir noticiados no JL, mas sobretudo no Expresso. Tivemos agora um ciclo de mesas redondas sobre «Ciências da Vida e Ética». Temos também um protocolo com a Câmara Municipal de Ponte de Sôr, que é onde se situa a herdade, e desenvolvemos lá um outro tipo de actividades, principalmente exposições de pintura, precedidas, no dia da inauguração, por uma conferência. A Fundação Gulbenkian também teve aí um papel muito importante, não directamente relacionado connosco, mas porque financiou o restauro da antiga Câmara Municipal, onde está agora a Biblioteca Municipal Calouste Gulbenkian.

— E os seus hobbies ?

— Bom, eu não tenho propriamente hobbies, a menos que queira considerar um hobby o meu interesse pelas artes e pelas letras. Gosto muito de música. Mozart, Beethoven, Haydn, Bach, Schu-bert. Talvez o meu favorito seja Beethoven, o grande apaixonado, o grande romântico, se calhar porque a época em que eu ouvia mais música foi a minha juventude, e a juventude é quase sempre apaixonada e romântica. Nos últimos anos tive a sorte de as minhas actividades profissionais serem justamente aquelas que eu me sentia capaz de desempenhar com verdadeiro prazer. As actividades da Fundação preenchem-me completamente, de forma que não sinto uma grande necessidade de ter um hobby.

— Senhor Marquês, há quem diga que a aristocracia morreu com Luís XVI no cadaf also. Acha que é verdade?

— Bom, depende daquilo que se entende por aristocracia. Se por aristocracia estamos a falar de uma série de privilégios, alguns dos quais francamente inaceitáveis e abusivos, nesse aspecto sim, com certeza, realmente a Revolução Francesa representou, e felizmente, o fim de situações e de «direitos» que efectivamente não faziam sentido no século XVIII, e muito menos hoje, se é que alguma vez o fizeram. Noutro sentido, em que a aristocracia representa a manutenção de uma tradição, uma consciência histórica que normalmente não está tão presente nas outras classes sociais, uma certa responsabilidade perante o nome, embora isso também exista, sem dúvida, nalgumas famílias burguesas que criaram também uma certa tradição, e fazem gosto em honrar o seu nome, e eu acho isso muito bem, mas de qualquer forma penso que esse sentido histórico de se ser o elo de uma cadeia, de se fazer parte de um todo, talvez seja a característica mais importante da aristocracia, e nesse aspecto eu penso que a aristocracia é uma classe que não morreu, e que continua a existir. É evidente que existem pessoas com mais consciência de classe do que outras, mas eu não acho que se possa dizer que a aristocracia morreu. Por outro lado a aristocracia é também um facto social. Há coisas que uma pessoa comum não conseguiria, e que a pessoa que declina um título acaba por conseguir. Não quer dizer que isso aconteça sempre, nem quer dizer que isso esteja certo, mas que é verdade e que acontece, isso é.

— O Senhor Marquês acredita que o actual duque de Bragança ainda tem uma chance de se vir a sentar no trono português?

— Eu acho que se têm visto coisas muito mais extraordinárias. Não é que ache muito provável, mas se há dez ou quinze anos nos dissessem que o regime soviético iria cair, que a União Soviética se iria dissolver e que o Muro de Berlim iria ser demolido num prazo tão curto, eu tenho a impressão que 99 por cento das pessoas não teriam acreditado, e portanto não sei. Hoje em dia dificilmente ponho limites àquilo que pode ou não pode acontecer. Não acho que seja uma coisa muito provável, mas pode haver um conjunto de circunstâncias que tornem possível essa solução ou que a tornem uma boa alternativa. De certa forma acho que seria mau sinal, porque acho que se isso acontecer é porque a nossa democracia funcionou mal, e não foi feliz, e eu espero bem que isso não aconteça. Mas penso que há circunstâncias em que tudo é possível, e acho que é importante, como «reserva», em alternativa à República, que exista a figura do herdeiro da Casa Real, é bom que exista, e pode acontecer que um dia o país necessite de recorrer ao regime monárquico.

— Senhor Marquês, se o Senhor Dom Duarte, por hipótese, fosse aclamado rei, o senhor dava–Ihe o seu apoio?

— Sim, com certeza. Aclamado ou não, a partir do momento em que eu pedi ao Senhor Dom Duarte e ao Conselho de Nobreza o reconhecimento dos títulos da minha Casa, e da representação genealógica das famílias que represento, assumi naturalmente um compromisso de lealdade e apoio em relação ao Senhor Dom Duarte, e portanto, desde que não vá contra a minha consciência, o Senhor Dom Duarte pode contar sempre com a minha lealdade. Sendo ou não aclamado, nesse aspecto não me faz muita diferença.

— O Senhor Marquês costuma freqüentar o Beija-Mão Real no Castelo de S. Jorge, no 1° de Dezembro?

— Não. Não costumo lá ir.

— Como é que o Senhor Marquês equaciona o nascimento anunciado do herdeiro do trono português com o futuro político de Portugal?

— Bom, nós não sabemos quem vai ser essa criança, portanto é difícil dizer, pode ser uma pessoa extraordinária que pelas suas qualidades, pela sua maneira de estar, pelo seu relacionamento com as pessoas e com o país venha a conquistar mais adeptos para a Monarquia em Portugal. Aliás eu acho que o Senhor Dom Duarte já começou a fazer isso. Ele conseguiu criar um movimento de simpatia importante e penso que tudo isso é mais viável agora do que há quinze ou vinte anos, e portanto pode acontecer que a personalidade do futuro representante da Casa de Bragança possa ajudar, mas é claro que tudo isso são coisas imprevisíveis.

— Como é que o Senhor Marquês se relaciona com os outros membros da aristocracia portuguesa? Há um espírito de classe, de união, a ligar as pessoas?

- De um modo geral não há muito esse espírito de união. Um espírito de classe talvez haja, no sentido em que todos nós temos talvez alguma experiência em comum, e pelo menos uma responsabilidade em comum perante as nossas próprias Casas. Nesse sentido sim. Mas eu também sou um caso um pouco particular. Eu sou um marginal dentro da minha classe, devido ao posicionamento político que assumi desde a minha juventude e ao longo dos tempos. Sou um marginal dentro da aristocracia portuguesa, e não tenho muitos contactos. É claro que conheço as pessoas, algumas até são pessoas com posições políticas de esquerda, de quem me sinto ideologicamente mais próximo, mas a tendência maioritária da aristocracia é conservadora, e aliás até seria esquisito se fosse de outra forma. Embora o sejam por vezes mais na aparência do que na essência; tenho por exemplo um primo direito que é o meu herdeiro, que parece muito mais conservador do que é na realidade, porque nas atitudes que tem perante a vida e na maneira como se comporta, no fundo é muito menos conservador do que parece e talvez até do que ele próprio julga.

— Senhor Marquês, depois de o conhecer um bocadinho esta pergunta não faz muito sentido, mas enfim… o senhor vota no PPM? Sente de alguma forma o peso de uma obrigação moral, ancestral, no sentido de votar no Partido Popular Monárquico?

- Não. Nem por sombras. Já votei no PPM em circunstâncias especiais, nomeadamente por causa da figura do arquitecto Ribeiro Telles, que é uma pessoa que eu considero muito. É, sem dúvida, um homem de grande inteligência, um sonhador, mas às vezes um bocadinho exagerado; talvez prejudique as causas que defende por as defender tanto, mas se calhar se não o fizesse tanto também não era tão ouvido. Há radicalismos que são necessários à sobrevivência. Já votei uma vez no PPM, mas normalmente o meu voto é no Partido Socialista, embora não seja filiado em partido nenhum.

— Senhor Marquês, o senhor pensa que um nobre que não tenha meios de fortuna para fazer brilhar o seu título, deve prescindir dele?

— Esse é um ponto sobre o qual nunca reflecti maduramente, mas parece-me que é uma pergunta que faz todo o sentido e é difícil de responder… Olhe… acho muito digna e correcta a posição de alguns nobres, como a pessoa que me referiu, que tomaram essa atitude, o que não quer dizer que ache o contrário incorrecto. Por um lado deve haver uma certa ligação entre um título e um certo estatuto, digamos assim, embora o título só por si já confira algum estatuto, mas por outro, não acho que seja óbvio, de maneira nenhuma, que o facto de uma pessoa viver em condições financeiras menos brilhantes seja para essa pessoa impeditivo de usar títulos de nobreza. É claro que, ao longo da História, os títulos de nobreza estiveram geralmente ligados a um certo estatuto financeiro, embora as grandes Casas tenham passado alguns períodos históricos em situações econômicas mais difíceis, embora essas dificuldades fossem geralmente relativas. Quem tem muitas dívidas é porque tem algum dinheiro, porque se uma pessoa deve um milhão de contos automaticamente é considerada uma pessoa rica, mesmo que não tenha um tostão, o que é uma situação um bocado absurda. Há casos de famílias com títulos, e títulos importantes e antigos, que ao fim de um certo tempo a viverem em condições extremamente modestas acabaram por perder um bocado a consciência das Casas que representam, mas o que também é verdade é que a realidade não é uma coisa estática, e numa família com poucos recursos econômicos pode voltar a aparecer gente capaz de recuperar um certo à-vontade financeiro. Eu sei que existem algumas famílias cujos representantes foram pessoas modestíssimas, mas que com a evolução das condições sociais puderam fazer por exemplo uma licenciatura, exercer uma profissão liberal, e ascenderam a uma posição social mais elevada.

— Para acabar, Senhor Marquês de Fronteira, como é um dia normal da sua vida?

— Olhe, a minha mulher e eu nesta altura achámos que a Fundação se estava a «intrometer» um bocadinho na nossa vida privada, a «pesar» um pouco no nosso casamento, e decidimos alugar um apartamento e não viver aqui, pelo menos durante um tempo. Chego ao escritório por volta das onze da manhã, almoço cá, e estou muitas vezes até às seis, até às sete horas e, nos dias em que tenho acti-vidades da Fundação, fico até à meia-noite ou coisa parecida. A maior parte dos dias passo o serão com a minha mulher. Vou para casa, janto, não vejo muita televisão, até porque os programas interessantes começam todos tardíssimo, e eu preciso de dormir oito horas, para no dia seguinte me sentir em condições para trabalhar. Sobretudo no Canal l e na SIC, os programas que apresentam até às onze horas, meia-noite, são perfeitamente «intragáveis», são de um mau gosto confrangedor, enfim, deve haver pessoas que gostam, não é… mas é pena. A RTP 2 já tem outro nível, e a TVI tem uma programação mais ecléctica que é mais parecida com aquilo que foi a certa altura a RTP l, que era um canal «generalista» com um bom nível qualitativo. O que acontece com o Canal l e com a SIC é que eles não respeitam os horários, quando se consegue gravar um programa é mera coincidência, quase não fazem intervalos entre os programas, e depois no meio dos programas fazem intervalos enormes, devem ser tudo técnicas publicitárias, com certeza, e se em relação à SIC é mais compreensível porque é um canal privado, cujo objectivo é obviamente o lucro, já a RTP l é um canal público, que é pago em grande parte pelos nossos impostos, e acho que esse estado de coisas não se justifica.

Esta entrevista não ficaria completa sem a transcrição de algumas palavras dirigidas pelo actual marquês de Fronteira ao seu herdeiro num «sermão» lido no Palácio Fronteira no dia 16 de Março de 1994.

«Pela ordem natural das coisas, caber-te-á, Antônio, mais tarde ou mais cedo, presidir aos destinos desta Fundação. É um fardo pesado que te deixo e que tu saberás conduzir, espero que com mão segura, até à próxima geração. Como tudo, tem os seus encantos, mas tem sobretudo muitos espinhos. Não é uma situação fácil aquela que te lego.

Viverás numa casa que é tua mas que não é só tua: é propriedade duma Instituição que nela funciona e de que tu serás a menor pane. Presidirás a um Conselho Directivo que, se tudo correr bem, de vez em quando se virará contra ti. Votarás numa Assembléia Geral em que deténs a maioria absoluta dos Títulos de Participação mas em que não podes decidir nada sozinho. Dirigirás uma Fundação a que todos chamarão tua, mas que, tu, saberás que, na verdade, não é tua. E pouco mais te posso dizer porque, por um lado, a minha experiência nesta área apenas tem alguns anos e porque, por outro, a minha situação como fundador é diferente, para melhor e para pior, do que será a tua.

Ao teu pai coube o mais duro, que foi recuperar o Condado da Torre, a mim coube-me o mais aliciante, que foi criar a Fundação, a ti caber-te-á o mais difícil, que é saber conservar tudo isso.

Antônio, sé digno da Fundação e faz com que a Fundação seja digna de ti. Aprende a ajustar-te à sua realidade, procura conservar os equilíbrios já conseguidos e luta por aprofundá-los. Mas, acima de tudo, sé tu mesmo.»

(Fonte : “A Nobreza Portuguesa, Teresa Castro d’Aire” 1996)

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