terça-feira, 23 de março de 2010

ENTREVISTA DE S.A.R. O SENHOR DOM DUARTE AO "CORREIO DE LAGOS"



D. Duarte de Bragança, Herdeiro do trono de Portugal


Correio de Lagos
21-12-2009

“Haverá condições para um referendo sobre a causa monárquica desde que não haja uma pergunta estupidamente fanática e orientada como aconteceu no referendo sobre o aborto.”



D. Duarte Pio transporta para o imaginário popular essa auréola que nos faz recuar até esses tempos da história em que a realeza prosperava e se encontrava no topo da pirâmide social. Após a implantação da República e abolição da monarquia, o país começou-se a divorciar dessa herança secular que o regime monárquico transportava consigo. E mesmo com constantes convulsões sociais, algumas delas de contornos bem radicias, atravessados por um regime onde o absolutismo prosperou e a democracia sossobrou, nunca se colocou a hipótese de se restaurar o regime monárquico. E, neste particular, Portugal quis-se distanciar do processo seguido com o nosso vizinho do lado.

E no meio de todos os percalços que o país teve de atravessar, chegou-se aos cem anos do republicanismo praticamente sem vacilar. As comemorações deste primeiro centenário estão prestes a iniciar-se.

No meio deste entusiasmo e de todas as verbas para esta comemoração, fomos ter com D. Duarte Pio de Bragança para colher a sua opinião. E, como não podia deixar de ser, a sua visão sobre estes 100 anos de republicanismo não é de molde a dar-lhe qualquer nota positiva. Por isso, não é de surpreender que se interrogue sobre a verba atribuída a estas comemorações e que olhe para o 5 de Outubro como uma data a celebrar, apenas devido ao tratado de Zamora, e não como o do dia da queda da monarquia e da revolução republicana. E para dar corpo à sua tese, faz-nos relembrar as constantes convulsões sociais e ao atraso do país em relação aos demais desta Europa Comunitária. Não convencido de que a causa monárquica esteja distante do coração do povo português, mostra-se favorável a um referendo cujas perguntas não sejam tendenciosas nem as suas premissas sejam falaciosas.

Para remar contra o republicanismo militante e contra uma ideia monárquica cada vez mais distante, D. Duarte Pio procura transmitir uma imagem de simpatia capaz de contagiar ao mesmo tempo que se vai empenhando em causas onde o altruísmo começa a fazer escola. Também o empenhamento em iniciativas ligadas às causas nacionais, com particular incidência às ligadas à lusofonia, tem contribuído para a sua maior divulgação e para uma imagem positiva junto da população.

Para perceber melhor o seu estilo de vida simples e feito de sobriedade, a par de todo o seu pensamento sobre a nossa sociedade, fomos ter com D. Duarte Pio na véspera dos 100 anos da Comemoração do regime republicano. Tudo o que o Duque de Bragança tem para nos dizer, podemo-lo ler ao longo desta entrevista.

CORREIO DE LAGOS – Vamos comemorar, para o próximo ano, os 110 anos da República. Como é que o herdeiro do trono de Portugal encara uma comemoração como esta?

D. DUARTE DE BRAGANÇA – Primeiro, gostava de começar por contar uma história que tem uma certa piada. Em 1910, proclamaram a República de Portugal. Mas esquecerem-se que Portugal tinha dois reinos. Um era o de Portugal e o outro era o do Algarve. Ninguém se lembrou de proclamar a República do Algarve nem de extinguir o reino do Algarve. Não há nenhum acto jurídico que o tivesse extinguido. Aqui há uns tempos atrás, tive ocasião de dizer ao Presidente da República, num jantar que tive com ele, em Lagoa, que, além de Presidente de Portugal, era também Rei do Algarve. Caso não fosse ele, então seria eu. Achou muita graça e respondeu-me da seguinte forma; ainda bem que o Dr. Mário Soares não sabia disso!...

Dito isto, penso não haver muita coisa para comemorar. O país, em 1900, estava, por um lado, a meio do desenvolvimento. Hoje, está no fim, dispõe dos últimos lugares dos países desenvolvidos. Atrasamos, nestes últimos 100 anos, 50% do nosso desenvolvimento comparativamente com o resto da Europa. Por outro lado, a implantação da República foi feita por um golpe militar contra um regime democrático. A monarquia da época era democrática. Havia um partido republicano que tinha ganho as eleições em Olhão e em Lisboa. Mas, a nível nacional, dispunha de 7% dos votos. O que temos para festejar, durante estes cem anos, são três revoluções. Uma delas deu lugar a uma da ditadura . Vão-se gastar 10 milhões de euros para se festejar, no fundo, um acto que só prejudicou o país. Se a revolução de 1910 tivesse valido a pena, então porque é que se teria feita a revolução do 25 de Abril? A revolução do 25 de Abril é a prova provada que o golpe republicano de 1910 foi um falhanço.

C. de L. - Apesar das leituras e apreciações que se possam fazer sobre este período da nossa história, perguntar-lhe-ia se, como monárquico que é, vai participar nestas comemorações ou procurará manter algum distanciamento?

D. D. - O 5 de Outubro é uma data que devemos comemorar. Mas não como o dia de um golpe militar. O que se deve comemorar a 5 de Outubro é o “Dia da Independência de Portugal”. Foi neste dia que se celebrou o “Tratado de Zamora”, reconhecido pelo próprio Papa, que deu a independência a Portugal. Se analisarmos a história, constatamos que, com esse golpe militar de 5 de Outubro, veio um conjunto de perseguições. Foram perseguidos os monarcas, a Igreja, os sindicatos e até os socialistas. Foram tempos de grande caos, de desordem e de mortes. E tudo continuou até à segunda revolução militar republicana que teve lugar em 1927, e que, instalou uma ditadura que colocou o Dr. Oliveira Salazar como 1º Ministro. E todo esse regime se prolongou até 1974 que, no início, nos ia levando para um regime de ditadura comunista. Felizmente, conseguimo-nos livrar dessa. Hoje, somos um país normal, europeu, mas o mais atrasado de todos.

C. de L. - Quais são as relações de D. Duarte com o Estado Republicano Português?

D. D. - Tenho óptimas relações com vários membros do Governo e com o Sr. Presidente da República. Dou a minha colaboração sempre que esta possa ser útil. Por exemplo, em 1999, a propósito do problema que então se vivia em Timor, colaborei bastante com o Governo Português. Nomeadamente, procurei dar alguma ajuda ao Dr. Jaime Gama, então Ministro dos Negócios Estrangeiros, que, como é do conhecimento público, foi o primeiro a desbloquear o impasse entre a posição portuguesa e a posição indonésia. A minha proposta ia no sentido da Indonésia dar uma grande autonomia e um estatuto federado a Timor Leste. Esta proposta foi aceite pelo Governo Indonésio e, como consequência, foi aceite, igualmente, a mudança em Timor.

C. de L. - É convidado com alguma frequência para cerimónias do Estado ou, por norma, esses convites não acontecem?

D. D. - A nível municipal, sou convidado com bastante frequência. A nível nacional, sou convidado para cerimónias mais de carácter histórico. Nessas cerimónias, em que faz sentido estar representada a família dos reis de Portugal, desde D. Afonso Henriques a D. Manuel II, então sou convidado.

C. de L. - Nunca foi recebido, no Palácio de Belém, por nenhum Presidente da República?

D. D. - Visitei todos os presidentes da República, excepto o Dr. Jorge Sampaio.

C. de L. - Houve algum motivo especial para não o visitar?

D.D. - Não houve razão nenhuma. Foram visitas a título pessoal. Começaram com o Almirante Américo Tomás, seguiram-se com Marchal Spínola que era meu amigo e continuaram com o General Eanes que é uma pessoa que muito admiro.

C. de L. - Como é que, em seu entender, a sociedade portuguesa encara a figura do herdeiro ao trono, em particular, e a causa monárquica, em geral?

D.D. - A minha posição, a minha obra e o meu testemunho de vida são relativamente conhecidos. E a maior parte das pessoas estão de acordo. Mesmo os que estão contra não têm uma posição hostil. Serão poucos os que manifestam alguma hostilidade. Há republicamos que, por exemplo, podem ter algumas atitudes desagradáveis. Muitos deles, curiosamente, até eram monárquicos, mas por se terem zangado, começaram a manifestar uma atitude adversa. Estou convencido que a maioria das pessoas que têm algum preconceito contra a monarquia o alimentam mais por uma questão de ignorância e por falta de observação da realidade política contemporânea. Se, porventura, observarem o que se passa nas monarquias europeias, constatam que são muito mais democráticos e mais avançadas que a maioria das repúblicas e, certamente, muito mais do que nós. Ninguém dirá que os escandinavos, os habitantes do Reino Unido ou os espanhóis estão pior do que nós.

C. de L. - Quais são os valores defendidos pela causa monárquica que não o sejam pela República?

D. D. - Ouvi vários primeiros ministros, entre os quais os da Holanda e da Suécia, dizer que eram uma república e que os seus reis e rainhas eram os seus melhores defensores. Queriam dizer com estas afirmações que as chamadas conquistas republicanas do princípio do século XIX já existiam nas monarquias ou, hoje em dia, estão nas monarquias europeias. Enquanto um presidente da república pode ser um homem excepcional, como o é o Prof. Cavaco Silva, tem sempre uma enorme dificuldade em manter a máxima independência devido à tendência do seu partido. Todos os presidentes têm por cima a carga de um ambiente partidário. A grande diferença na monarquia está na independência da chefia de Estado em relação às forças económicas, políticas e outras. Além disso, a sua manutenção por vinte ou trinta anos transmite conhecimento e estabilidade ao próprio Governo. E como podemos verificar, mesmo em Portugal, muitas vezes os presidentes da república são adversários do próprio governo. Ainda recentemente um demitiu o parlamento sem dar motivo nenhum. Como era boa altura para o seu partido ganhar as eleições, o Parlamento foi demitido. Isto mostra a diferença entre um Chefe de Estado independente e um chefe de Estado que vem do meio partidário. Já não vamos falar na América do Sul em que os chefes de Estado acabam por ser ditadores.

C. de L. - Após estes 100 anos da República, a sociedade portuguesa está mais ou menos aberta aos valores defendidos pela monarquia?

D. D. - Portugal estava habituado a viver num Estado de direito e em paz. A partir da monarquia liberal, vivia num regime democrático e moderno para a época. Com o regime republicano, passou a viver com ditaduras, golpes de estado e em constantes convulsões sociais. Tudo isso, contribuíu muito para o atraso económico e cultural do país. Hoje em dia, estamos na cauda da Europa. Chegamos, inclusive, ao cúmulo de alguns indivíduos, que usam bilhete de identidade português, dizerem que preferem ser espanhóis.

C. de L. - Faz sentido que haja, num regime republicano, um partido monárquico a debater-se, em pé de igualdade, com os demais para ter lugar na Assembleia da República?

D. D. - Também durante a monarquia houve o partido republicano que chegou a ganhar várias eleições. Por isso, teoricamente faz sentido. Mas o que acontece é que esse partido, até hoje, nunca representou os monárquicos. Representou apenas alguns monárquicos que se juntaram a ele. O grande inconveniente da existência do Partido Monárquico é muita gente associar os partidários da monarquia a esse partido. Há monárquicos em todos os partidos.

C. de L. - Há uns tempos atrás, alguns defensores da causa monárquica protagonizaram um episódio algo insólito ao deporem a bandeira nacional para a substituir pela da monarquia, na Câmara Municipal de Lisboa. Como é que encara um episódio como esse?

D. D. - Em primeiro lugar, não tiraram a bandeira nacional. Tiraram a bandeira da Câmara Municipal que não é um símbolo nacional. E, em vez dela, colocaram uma bandeira nacional que tem a mesma dignidade de todas as demais, incluindo a actual verde e vermelha. É verdade que não foi legal. Por isso, não posso apoiar esse gesto. Mas tratou-se de uma brincadeira destinada a chamar a atenção, provavelmente, para a necessidade de se respeitar e expor mais os símbolos nacionais formados por todas as bandeiras nacionais desde D. Afonso Henriques até à actual.

C. de L. - É a favor de um referendo aos portugueses para avaliar a adesão ou não da causa monárquica ou pensa que não há condições para a sua realização?

D. D. - A causa monárquica é a Causa Real. Engloba todas as reais associações a nível nacional. A do Algarve, que tem a sua sede em Faro e com outras espalhados por vários concelhos algarvios, conta com grupos sociais e económicos das mais diversas proveniência. Quanto às condições a existir ou não para um referendo sobre a causa monárquica, estou convencido que sim. Haverá condições, desde que não haja uma pergunta estupidamente fanática e orientada como aconteceu no referendo sobre o aborto. A pergunta orientava logo para o voto no sim. Penso que se poderia perguntar aos portugueses se achavam que deveriam ter um chefe de Estado Rei ou um Presidente da República tal como acontece nos países mais desenvolvidos da Europa. É tudo uma questão de liberdade de informação e de honestidade na pergunta.

C. de L. - Qual é o dia a dia de um Rei sem trono como o é o de D. Duarte de Bragança?

D. D. -Todos os dias são diferentes. Por exemplo, esta manhã fui abrir uma conferência sobre mediações entre Portugal e Indonésia, no Museu do Oriente. Depois, vim estar consigo e resolver alguns assuntos da Fundação. A seguir, vou abrir uma Conferência Internacional sobre o “Mar e as Pescas”. No final da tarde, terei que estudar com os meus filhos.

C. de L. - Tem conseguido manter uma imagem de alguma simpatia junto dos portugueses, apesar de vivermos em regime republicano. Qual é o segredo para conseguir manter essa imagem amigável e de simpatia junto da população portuguesa?

D. D. - A maioria da população portuguesa é constituída por pessoas simpáticas. Interesso-me, também,pelos problemas nacionais actuais. O meu defeito, por vezes, é envolver-me com demasiadas coisa ao mesmo tempo. E nem sempre lhes consigo dar o andamento que gostaria. Tenho, por isso, de ser mais selectivo naquilo em que me envolvo. Mas como não disponho de meios financeiros, não posso desenvolver mais actividades e manter um contacto mais regular com a população portuguesa. Tenho que me ater a algumas iniciativas a que tenho tido acesso. Por exemplo, as entrevistas na televisão tem sido úteis por me permitirem um contacto mais pessoal e directo com as pessoas. Também, para este contacto, acredito muito na imprensa regional e local. É um tipo de imprensa lida, desde a primeira até a última página pelas pessoas.

C. de L. - Para além das causas sociais a que se dedica, há alguma actividade política regular desenvolvida por D. Duarte?

D. D. - No sentido político-partidário do termo, obviamente que não. As reais associações e a Casa Real estão envolvidas, em termos locais e nacionais, e contam com pessoas de todos os partidos. Desenvolvo também a minha actividade, em diversos institutos e instituições. Sou membro do Conselho da Confederação das Cooperativas Agrícolas e do Crédito Agrícola e sou, também, Presidente de uma Caixa Agrícola. Sou ainda Presidente do Instituto da Democracia Portuguesa que tem desenvolvido actividades muito interessantes e sou sócio e colaborador de outras instituições ecológicas e ambientais. Também tento envolver a Fundação em muitas actividades de utilidade como as que têm vindo a ser desenvolvidas com os países lusófonos como a Guiné Bissau, Timor, São Tomé e Príncipe e, em breve, também Angola. Também já enviámos missões ao Brasil com uma missão importante a desempenhar.

C. de L. - De que tipo são as diversas intervenções que vai tendo pelo país adiante?

D. D. - Pelo país adiante, procuro responder aos convites que me são dirigidos. Por ano, por norma costumo visitar dez, vinte ou trinta sítios a convite das respectivas câmara municipais. Este ano não pude aceitar muitos desses convites para estar mais com o filhos, sobretudo aos fins-de-semana.

C. de L. - A sua recente passagem pelo Algarve, mais concretamente por Estói, insere-se nesta lógica de convites que as Câmaras Municipais lhe costumam endereçar?

D. D. - Essa deslocação a Estói deu-se na sequência de um convite que me foi endereçado por um grupo de estrangeiros e portugueses que lá se costumam reunir. Pediram-me para fazer uma conferência sobre a história recente de Portugal. Lá fui e tentei dar-lhe uma visão um pouco humorística e mais engraçada do que a habitual. Foi dentro deste espírito que procurei abordar os últimos anos da história de Portugal.

C. de L. - Em Lagos, já foi convidado, por mais do que uma vez, para algumas cerimónias. Em que cerimónias é que já participou na cidade das Descobertas?

D. D. - A primeira, há anos atrás, foi relacionada com o Infante D. Henrique. Também este ano, o Instituto da Democracia organizou um curso sobre temas bastante interessantes. E, novamente, estive em Lagos, durante dois dias consecutivos, com gente de todo o país.

C. de L. - Que imagem tem da cidade de Lagos?

D. D. - Cada vez que vou a Lagos, sinto uma grande alegria em ver que a cidade antiga foi salva. Essa parte de Lagos foi preservada e, ao contrário do que acontece noutras cidades algarvias e portuguesas, não foi desfigurada. Nesse aspecto, é um lugar que vale a pena visitar. É agradável e dispõe de uma paisagem muito bonita. A parte moderna podia ser melhor. Dispõe de uma arquitectura um pouco caótica à semelhança do que se vê um pouco pelo país adiante. Cada um faz o que quer e de qualquer maneira. Não há uma harmonia urbanística nem um plano director que lhe traga algum equilíbrio.

C. de L. - Lagos e o Algarve estão a ficar excessivamente dependentes do turismo. Este caminho de exploração exclusiva desta via não será perigoso demais?

D. D. - É muito perigoso. O turismo é uma actividade muito frágil. Basta um susto, um terrorismo qualquer, uma causa natural ou uma crise internacional e as pessoas cortam logo no turismo. Ou se não cortarem, procuram sítios mais sossegados. Trata-se de um grande risco. É indispensável que o Algarve disponha de serviços que funcionem o ano todo. Devem ser serviços não poluentes para poderem conviver em sintonia com o turismo. Além disso, é muito importante que o desenvolvimento não fique todo acumulado no litoral. Terá de haver um maior equilíbrio entre o litoral e o interior. Um outro turismo a explorar, o turismo de futuro, é o de termas, de saúde, de manutenção e que chame as pessoas reformadas. O turismo pior, do ponto de vista de aproveitamento de recursos, são os parques de campismo. Quem vai para um parque de campismo, só o fez pelo preço. Se no ano seguinte encontrar outro mais barato, muda de sítio de imediato. É verdade que quem compra uma casa investe nela. E com a sua manutenção, está sempre a investir. Mas esta situação não justifica estes milhares e milhares de casas que se constroem por todo o lado. Trata-se de uma situação sem controlo nenhum.

C. de L. - Tenho conhecimento de que irá também ser convidado a participar nas “Celebrações dos 550 Anos da Morte do Infante” que têm o seu epicentro em Sagres e Lagos. Qual a visão que tem desta figura maior da história de Portugal?

D. D. - Tem imenso interesse universal. Deveremos manter sempre vivo o seu conhecimento, quer junto dos jovens portugueses, quer também junto dos estrangeiros. Como figura universal que é, abriu as portas ao comércio entre a civilização ocidental e as civilizações do oriente. Também, a abertura da Europa ao mundo foi iniciada pela sua mão. E já que se fala em Sagres, queria realçar a beleza de um concelho como o é o de Vila do Bispo em termos de arquitectura e de paisagem. É um modelo para o resto do país. Souberam preservar aquele concelho de uma maneira exemplar. O pior são aqueles caixotes que construíram na Fortaleza de Sagres. Se algumas construções ali fizessem, que as adaptassem mais às do tempo do Infante D. Henrique. O que se lá vê degrada a arquitectura do lugar.

C. de L. - A sociedade portuguesa deve manter-se como uma sociedade laica ou privilegiar as suas raízes cristãs?

D. D. - A expressão laica é muito mal interpretada. Em geral, é interpretada como sendo anti-religiosa. E essa, infelizmente, tem sido a atitude de políticos responsáveis. O cristianismo faz parte das nossas raízes culturais. Somos o que somos, por sermos um povo cristão. É verdade que também há muita gente que não é cristã. Mas temos que ter em conta que se formos a Israel ou escolhermos para lá viver, não nos vamos queixar de ver símbolos do judaísmo em todo o lado. Também, se alguém vier ou quiser viver em Portugal tem que aceitar a sua história e o seu povo. Não faz, por isso, sentido querer retirar os crucifixos das escolas ou dos tribunais. Curiosamente, o Bastonário da Ordem dos Juízes da Bélgica disse, recentemente, que era ateu. Mas queria os crucifixos nos tribunais para lembrar um grave erro e uma injustiça judicialmente cometida há 2000 anos atrás.

C. de L. - Será ainda possível ver um monarca português ocupar o Palácio de Belém ou essa será uma mera utopia?

D. D. - Se o povo português, um dia, se puder pronunciar e fizer uma escolha livre sobre a forma de Chefia de Estado que quer ter, tudo é possível. Ainda há outra possibilidade, a do Estado reconhecer oficialmente que há uma família real, que representa a recente história portuguesa e convive com a República como ela é hoje.

C. de L. - Daqui para a frente, a Família Real será mais um elemento simbólico dentro da sociedade portuguesa ou ainda poderá vir a exercer qualquer tipo de poder?

D. D. - Depende inteiramente dos portugueses decidirem se querem ter um Chefe de Estado, Rei ou um Chefe de Estado, Presidente da República. E mesmo uma decisão dessas não seria necessariamente eterna. Ao contrário das repúblicas, a monarquia está sempre aberta a um referendo relativo ao sistema do Chefe de Estado que se quer. Ainda houve, recentemente, um na Austrália.

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